domingo, 11 de março de 2012

Dor transformada em poesia que transformada em sexo



Por que eu não estou feliz agora? Por que este dia foi uma droga? Eu não fiz nada. Eu estive pelado na minha cama o dia todo. Dormido e doentio. As pessoas não poderiam ter se importado menos, nem as poesias poderiam ter se importado menos. Mas hoje foi o meu dia e os objetos se materializaram demais e o vento ventou de menos, a televisão não se ligou, nem os livros foram lidos, nem o chão pisado. Minha cama foi deitada e, como camaleão, se camuflou em mim. Eu e cama somos as mesmas coisas. Quando alguém me vê, logo me confunde com uma cama. As crianças se jogam sobre mim, acha que meus pés suportam o peso. Mas as crianças, um dia, dormem e sonham em ser um adulto que não sou eu um dia. Nenhuma criança no mundo acorda e pensa: Hoje eu quero ser ele. Criança nenhuma quer ser como eu sou. Criança quer ser heroi. Mas eu só sou heroi das palavras que eu escrevo. Criança, mesmo alfabetizada, não entende as palavras que eu escrevo, por isso sou cama. Apesar de hoje o chão não ter sido tocado, eu passeei pela casa. Procurei o que fazer e não encontrei nada. Logo nada foi tocado. Se eu disser que eu toquei em algo hoje, é mentira. Hoje não aconteceu e um dia perdido é um dia doído. Dias como hoje serão esquecidos mas sempre doídos.
E se em algum momento eu fui feliz, passou logo. E se em algum momento estive saudável, foi porque o amor me engolia.
Amanhã o dia chega e vive. E que o dia de amanhã aconteça. E que eu não seja só mais uma cama, mas seja todos os equipamentos criados para mim. Vocês não sabem, mas todos os inventores foram inventores para mim. Só inventaram a cama para que eu pudesse traduzi-la. Se não fosse cama, dormiríamos na rede. Mas rede também foi inventada para mim. Esse é o real motivo para que deus não exista. Esse é o real motivo para que deuses existam. Cada objeto é um deus. Poeta só é um estudador de deuses. Poeta não tem fé. Fé só é fé quando não é verdade. Os poetas sabem que esses deuses existem porque são tocados por eles. Hoje eu não toquei ninguém e não toquei nada. Por isso isso não é uma poesia. Isso é prosa suja. Isso é prosa dos entediados. Isso é prosa dos mortos. Mas se no outro dia o sexo for bem feito, com certeza o poeta volta. Os lençois, que sentem o cheiro do esperma, agradece. E a vida segue e mais um poeta morre. E mais um poeta reaparece.

{E a dor não foi embora, mas um dia ela vai. Porque todo mundo tem um caminho a percorrer.}

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